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Resenha Crítica: Filme Escritores da Liberdade, por Saulo Monteiro.

Diretor: Richard LaGravenese

Ano: 2007

Elenco: Hilary Swank, Patrick Dempsey, Ricardo Molina, Pat Carroll

Disponível na NETFLIX


O assassinato de George Floyd, um homem negro, por um policial em plena luz do dia e diante de inúmeras pessoas, provocou manifestações que varreram os Estados Unidos e acabaram se repetindo em inúmeras cidades ao redor do mundo.

Essas manifestações demonstram, de forma explosiva, a revolta geralmente contida de milhões de pessoas contra o racismo e contra o desprezo com que os brancos, do alto da sua hegemonia econômica e política, tratam os pobres, negros, latinos e asiáticos.

Nada mais atual: o filme Freedom writers – Escritores da liberdade – lançado em 2007 e dirigido por Richard LaGravenese, trata exatamente do racismo, da intolerância e da violência étnica e racial que imperam nos bairros pobres, nos guetos e nas gangs e de como a educação é uma força poderosa que consegue promover transformações tão significativas.

Baseado em uma emocionante e inspiradora história real, o filme retrata a experiência da jovem professora Erin Gruwell, recém chegada em uma escola pública americana, onde se depara com uma turma de adolescentes negros, latinos, asiáticos e brancos, os piores alunos da escola, todos violentos e membros de gangs, com passagens pela polícia ou oriundos de reformatórios.

Essa turma foi fruto da decisão das autoridades da educação pública, no sentido de promover um processo de inclusão dessas minorias, apesar da forte oposição de diversos professores e membros da diretoria daquela unidade escolar.

Sem nenhum apoio da escola, a inexperiente professora, munida apenas de uma enorme boa vontade, compromisso ético com a educação e muita criatividade, começou a demonstrar que o sofrimento, as tragédias familiares e violências sofridas eram comuns a todos eles, fazendo com que percebessem que tinham muito mais identidade do que diferenças entre si.

Com isso ela fez com que cada um deles experimentassem a sensação de pertencimento a um grupo e criou um ambiente acolhedor, um abrigo seguro onde podiam declarar seus sofrimentos, seus medos, suas frustrações e esperanças através da prática de escrever diários.

Utilizando o livro O diário de Anne Frank, os alunos ficaram sensibilizados com o sofrimento dos judeus diante da perseguição nazista, chegando à conclusão que muitas outras pessoas, em todos os tempos e lugares, sofreram discriminações e violência, mas que depende de cada um a forma de enfrentar essas situações. Cabe a cada um a escolha de como fazê-lo!

A partir dessa tomada de consciência, aqueles adolescentes antes profundamente revoltados, desmotivados e agressivos passam a perceber que é possível, como Anne Frank provou, reagir de maneira diferente – ao invés de retribuir com a usual violência e desprezo – às hostilidades sofridas.

Essa história real, quadro-a-quadro nos emociona e nos faz pensar no quanto a educação pode e deve transformar a vida dos alunos. Para muito além do conteúdo formal a que muitos – por formalismos ou acomodação – se apegam, a escola deve ser um ambiente acolhedor e agradável; deve lidar com os alunos considerando a sua realidade, suas frustrações e suas origens, muitas vezes em ambientes hostis e famílias desestruturadas.

A educação deve ser transformadora e a prática cotidiana deve ser marcada não por iniciativas isoladas de uma professora ou professor inquieto e inconformado com a realidade de seus alunos, tornando-se um Don Quixote voluntarista e solitário, mas cuja prática transformadora deve se tornar o seu modus operandi cotidiano e comum a todos seus agentes.

Essa história verdadeira, ocorrida em uma situação extrema e que acabou se transformando em uma prática inovadora e um modelo de abordagem, é uma prova concreta de que uma outra educação é possível. Uma educação inclusiva, emancipadora e construtora de um ser humano melhor, protagonista da sua própria história.

Para concluir, destaco uma feliz coincidência: assisti esse filme, cuja história ocorre em uma escola chamada Woodrow Wilson, no momento em que a Universidade de Princeton decidiu remover o nome do 28º presidente dos Estados Unidos da Escola de Assuntos Públicos e Internacionais devido às suas opiniões e políticas racistas, um nome inadequado para uma faculdade cujos acadêmicos, estudantes e ex-alunos devem posicionar-se firmemente contra o racismo, em todas as suas formas.

Saulo Monteiro de Souza

30 de junho de 2020.

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